quarta-feira, 2 de setembro de 2009

A volta do pai pródigo

Ele é do tipo cabeça-dura e amo ele ainda assim. Não via a hora de revê-lo tranquilo, longe dessas viagens longas do trabalho. É do interior, mas gosta mesmo é de litoral - tanto que os lugares que mais gostou foram a Bahia, Espírito Santo e minha casa. Não adiantava rodar por Minas nem ficar no meio da queima de cana de Piracicaba; o negócio do meu pai é mar, mesmo; não tem jeito.

Engraçado, ele foi o meu primeiro contato com pensamentos conflitantes. Uma pessoa tão sentimental e romântica, que mostra o quanto tem dessas qualidades só quando convém, pra preservar a face. Mas o velho chora quando toca uma música que lembra do pai, ou do sítio do vô dele, o Seu Leopoldo. Aquele lá matava boi com marretada na cabeça.

Meu pai não cansou de trabalhar. A contrário de mim, que demora pra chegar nos finalmentes, ele já foi engraxate, cobrador de ônibus, ajudante de posseiro. Uma vez, quando eu tinha dezoito, ele teve a ideia genial de se aposentar. O homem quase enlouqueceu de tanto tempo que nadafazia, bundando na tevê e no sofá. Controle na mão, um canal por segundo. Não demorou pra voltar a trabalhar.

Quis ser ou foi transferido algumas vezes, emprestado. Foi pra Piracicaba, onde passou um bom tempo, deixando saudade que não dá pra matar com visita ou outra. Nos deu um susto em janeiro, mas graças a Deus isso se resolveu... ninguém pode contra a vontade d'Ele. Se se diz jovem, então acabamos de voltar pro segundo tempo.

Sessenta anos como um flash. Sorrindo pra foto, cabeludo, rayban no bolso. Aquela carteira cheia de documentos, o canivete que corta até pensamento, rg de sabe-deus-quando. O espírito e as manias de justiceiro. Mudanças bruscas de assunto quando não há interesse. O rádio que quebrou quando o Corinthians perdeu. Os dois sentados tentando assistir um baile contra a Portuguesa Santista - e eu com medo dos fogos. Cartas de amor pra minha mãe. Fotos da minha irmã sentada no Opala. Estilingada no capacete, em algum campeonato. O telefonema dele, dizendo que tava voando no céu - seguido da minha calada inveja. Sessenta anos passando devagarinho.

Das vinte e quatro horas do dia, uma parte a brisa sopra do mar até a orla. De longe se vê as chaminés, imaginando os potes carriers e os tratores com pneus de dois metros. Cheiro de pastel de carne da feira, manhã de sábado, mortadela frita. Na outra parte dessas horas, o vento sopra em direção ao mar. Vai adorar ver aquela estátua tosca de peixe na entrada de Santos.

Ele volta amanhã. Osem Pirasykaba suí. Oîebyr paranãme.

Obrigado! Agora aproveita e engorda teus netos, por favor!

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